14 August 2008

LINHA DE MONTAGEM
(concluindo a revisão)



Beck - Guero

Há duas escolas de pensamento em confronto: segundo uma, Guero será uma espécie de revisão de matéria realizada por Beck onde se podem reconhecer sinais das várias etapas do percurso entre Mellow Gold (1994) e Sea Change (2002); para a outra, trata-se, afinal do (por ela) tão ansiado Odelay II, o regresso "ao melhor Beck" que, entretanto, se teria extraviado. Pelo que me toca, confesso que saltei na cadeira quando, à quarta faixa ("Missing"), tive de me beliscar para não continuar a acreditar que estava a ouvir... Sting! E isso não é uma coisa boa. Não é mesmo. Tal como o próprio Guero. Generosamente, pode argumentar-se que, no Grande Plano do Universo, a todo o músico é, desde o início, automaticamente oferecida a possibilidade de gravar um álbum menos bom, assim-assim ou até mau sem que, no balanço final, isso seja usado contra ele. Pode até invocar-se, por exemplo, o caso de Bob Dylan que, sem deixar de ser considerado genial, excedeu largamente a sua quota de atenuantes. Mas nem uma coisa nem outra deverão servir para mascarar a evidência: Guero é o primeiro álbum sobre o qual alguém deveria ter tido a amabilidade de aconselhar Beck a metê-lo na gaveta. Não tem a aspereza artesanal de Odelay, nem o delirante fogo de artifício de Midnite Vultures, nem a melancolia em plano aberto de Sea Change. Apenas o produto de uma linha de montagem de canções que Beck já deve ser capaz de pôr em movimento a dormir (trata-se só de accionar o botão junkyard-funk-country-blues-hip-hop), razoavelmente desinteressante e — isto já parece mais difícil de explicar — desinteressado, despachado em piloto automático. Há uma boa canção, "Broken Drum", e é tudo. Façamos de conta que nunca existiu.

(2005)

3 comments:

Anonymous said...

O Nuno Markl na altura escreveu a desancar-te por dizeres mal deste disco. Também não gostei do disco.

Anonymous said...

"dizeres mal"

Se é que isto é "dizer mal" em comparação com as peças de antologia que são os odiozinhos de estimação eh eh eh

Anonymous said...

A vida é difícil.Eu nunca consegui compor uma música,quanto mais ligar o automático. Não seria crítica demais?