26 January 2011

PETÚNIA À BEIRA DO DESMAIO




















Sun Kil Moon - Admiral Fell Promises

Mark Kozelek – desde as origens nos Red House Painters à discografia assinada com o próprio nome ou sob o heterónimo Sun Kil Moon – nunca foi o género de criatura que se convida para dar vida a uma festa. Nada de grave: Leonard Cohen, Nick Drake ou Mark Eitzel também não devem a celebridade ao facto de terem uma costela de "stand-up comedians" e isso não os impediu de, por entre dilúvios de melancolia e saturnidade, terem legado discografias memoráveis. Se, por outro lado, optarmos por tentar descobrir traços de afinidade estética com Neil Young – tanto em variante acústica como eléctrica –, instantaneamente nos aperceberemos de que nunca o canadiano praticou nada de tão entorpecente quanto a modalidade-Kozelek de rock/folk/country-on Xanax. Dylan?... Mas deixar-se-ia ele alguma vez apanhar a destilar (mesmo nos anos das trevas "born again") inefáveis essências poéticas do género “Come out from the burning fire, butterfly, let me lock you in my room and keep you for a while, could you be the answer to my every prayer?” Não, nem sequer Bonnie ‘Prince’ Billy, demasiado alucinado para poder dar-se a tais luxos de auto-comiseração. Kozelek vive, de facto, na sua bolha estanque de ruminativa solidão cultivada como uma petúnia sempre à beira do desmaio, terminalmente desinteressado de alterações de "mood" ou de expressão, sem rumo e sem alento, mas obstinado na multiplicação desta espécie de "easy-listening" para almas indie asténicas. Nessa exacta medida, Admiral Fell Promises é bem capaz de ser o seu melhor álbum: apenas voz e guitarra acústica entregue a arpejados devaneios monocromáticos, morosas ornamentações proto-“hispânicas” e, Zeus o proteja, um mundo sentimentalmente esfarrapado que não desiste de conspirar contra ele.

(2011)

5 comments:

nélito relhálha said...

já só falta deixar de fingir que o Ele não existe.

João Lisboa said...

... ?...

lia said...

: )) Gostei que tivesse ouvido e escrito sobre o disco. Curiosamente, e isto a propósito da última frase da crítica, eu também nunca fui uma indefectível dos Red House Painters ou do Kozelek, não obstante gostar bastante do primeiro disco dos Sun Kil Moon. Mas este, na sua contenção de meios (argh), tornou-se a petúnia favorita de 2010, firmando raizes também já em 2011 : )

João Lisboa said...

:)

... da última vez que tive petúnias na varanda, acabaram todas devoradas por uma invasão de pulgões verdes!...

lia said...

Pulgões, não conhecia essa palavra :D

Cá em casa as plantas dão-se muito mal, prova de que não herdei as mãozinhas e coração de ouro da minha mãe.

Agora tenho ouvido muito o novo da Emily Jane White, Ode To Sentience : )

Bom fim-de-semana!